Sobre BabyMetal, Rob Zombie e o teatro do Heavy

Recentemente, Rob Zombie postou uma foto ao lado das meninas do BabyMetal e declarou-se fã do grupo japonês que vem dando um nó nas cabeças dos headbangers puristas.

Os fãs de Rob o criticaram, dizendo que o BabyMetal “não é Metal de verdade” entre outras ofensas, e Zombie as defendeu nas redes sociais.

01

Quando as garotas japonesas surgiram com seu primeiro álbum, autointitulado, em 2014, todos fora do Japão acharam que era piada – como assim, três garotinhas que parecem que saíram de um anime estão cantando heavy metal com aquelas vozes esganiçadas de J-Pop? Isso não é Metal de verdade!

Acontece que a “piada” era séria: a fórmula inusitada conquistou uma gama de fãs pelo mundo e o segundo álbum do trio, Metal Resistance, que saiu esse ano, chegou em pouco tempo ao topo de diversas paradas pelo mundo.

Por que os fãs de heavy metal estão tão furiosos com o sucesso do BabyMetal? Seria porque a banda mistura o amado estilo com outros menos “true”, como dizem? Seu amado heavy, idolatrado quase como uma religião, torna-se “infectado” com outros estilos “inferiores” como o J-Pop? Ou será que é pelo fato de serem meninas graciosas à frente da banda, e não um cara batendo no peito e fazendo o sinal dos chifres, imortalizado por Ronnie James Dio, fazendo parecer que estão tirando sarro do gênero? Ah, já sei: é porque a banda é “produzida”, algo que veio da cabeça de um produtor ou empresário com o simples intuito de ganhar dinheiro.

Eu não gosto do som do BabyMetal por uma pura questão de gosto: eu não gosto de J-Pop, logo, os elementos dessa vertente que a banda mistura ao seu som acabam por me afastar de seus álbuns, mas, sinceramente, não vejo nada demais na existência do grupo – até me agrada o fato de alguém, finalmente, ter tido essa ideia e tê-la executado tão bem. O J-Pop é um estilo musical que vem dominando o resto do mundo ocidental, sendo trazido na bagagem dessa cultura “otaku”, palavra que, no Brasil, tornou-se designação para os fãs de anime, mangá e cultura pop japonesa em geral.

As misturas e experiências musicais são inevitáveis e, com a popularização do J-Pop, estava até demorando que alguém tivesse essa ideia com a intenção de atrair esse público para o universo da música pesada e ganhar dinheiro em cima dos dois tipos de fãs. Se você se sente desconfortável com esse diálogo aberto sobre música comercial, deixa eu te contar uma coisa: música é arte, linguagem, veículo de ideias mas, também, um produto. E o Heavy Metal é um dos maiores exploradores dessa característica.

O Heavy Metal é um grande teatro, cujo visual e performances de palco são tão importantes quanto a música – e não sou eu quem fala isso, mas uma das grandes “cabeças pensantes” do gênero:

Essa mesma cabeça pensante faz parte de uma das duas bandas que são estudadas por grandes universidades americanas e europeias por causa de seu marketing e relacionamento com o público – se grandes empresas tivessem clientes devotos às suas marcas como os fãs de Iron Maiden e Kiss são por eles, 90% de seus problemas estariam resolvidos. Esse amor acontece, não apenas por conta de seu talento musical, mas também de todo um marketing em volta deles: produtos inúmeros licenciados com suas marcas e uma áurea mitológica em torno deles (um “mascote” emblemático que todos amam, maquiagens icônicas que os fãs querem fazer igual, shows cheios de pirotecnia e efeitos, etc.) entre outros elementos. Isso também é manipulação de massa e, por mais que você diga que seu amor por essas bandas seja “verdadeiro e puro, pois pelo que me interesso MESMO é pela música deles”, não se engane: fazer você pensar assim também faz parte do discurso publicitário.

02
Se você quer comprar/ consumir ou já comprou/ consumiu um desses produtos, entre tantos outros, então você já atendeu ao marketing dessas bandas.

O BabyMetal não está fazendo nada de diferente de outras bandas de rock pesado, antigas ou novas, tornando-se tão autênticas quanto várias outras que, em tese, investem menos no visual que no seu som…

03

…não são nada produzidas por empresários com visual e som planejados para atrair público…

04

…não criam mitologias diversas ao redor de seus integrantes…

05

…e não fazem de tudo para explorar os bolsos dos fãs.

06

Se você não gosta, tudo bem. É um direito seu. Dizer, no entanto, que essas meninas que, nas palavras de Rob Zombie, estão na estrada fazendo um puta som enquanto estamos aqui “sendo velhos ranzinzas” e têm mais energia no palco que “90% das bandas que eu conheço”, não são do “Metal” é, no mínimo, incoerente, para não dizer hipocrisia.