Então os suecos do Pirate Bay foram condenados a um ano de prisão e a pagar uma multa de 30 milhões de reais (clique aqui para ler a notícia no portal da Folha). Condenado ainda não é preso, os caras têm a chance de entrar em recurso.
Logo que soube do fato, minha mente viajou no tempo até o início de todo esse circo: o século 20 estava em seus últimos anos quando o Napster, o primeiro e então único programa de compartilhamento de músicas, foi considerado ilegal. Um verdadeiro espetáculo na mídia, que narrava tudo em tempo real como se fosse uma luta de mundial de pesos pesados – e, de certa forma, era mesmo. De um lado, as grandes gravadoras, campeãs invictas há décadas, controladoras absolutas e incontestadas do mercado da música; do outro, o novato Shawn Fanning, criador do programa do “gato de headphone” que, ao aplicar um simples conceito de troca de arquivos através do uso da Internet, mudou para sempre o modo de o mundo enxergar o jeito de ouvir e comercializar música.
Assim como os suecos da “baía pirata”, Fanning também foi crucificado pelos coronéis da música, que comemoraram quando a corte decidiu que o Napster era, sim, um serviço ilegal que incita e facilita a pirataria de propriedades intelectuais. O Napster foi vendido e transformado em uma plataforma de comércio online de música, mas o ideal que o gato de headphone construiu cresceu em velocidade assustadora, mostrando que era apenas uma questão de tempo de este meio de ver e ouvir música mudar por inteiro – só estava esperando uma brecha para acontecer, se não fosse o Napster, seria outro recurso alguns meses mais tarde.
E quantos recursos foram surgindo, evoluindo e tornando-se populares para uma atividade vista como ilegal aos olhos da justiça! Redes diversas como Gnutella, e-Donkey, e-Mule, programas como Kaaza, Morpheus e Audiograbber, a tecnologia Torrent, sites de divulgação de arquivos Torrent como o Pirate Bay e tantos outros, comunidades no Orkut que divulgam links de CDs disponíveis nos Rapidshares da vida… Todos esses serviços, programas ou endereços na Web que eu acabei de citar foram ou são, de longe, alguns dos mais populares e adorados pelos internautas medium user pra cima – e os novos internautas já chegam na rede doidos para conhecê-los, de tanto que ouvem falar como é possível (e fácil) encontrar praticamente qualquer música que queira para baixar.
Mas peraí: isso não é criminoso, coisa feia, pecado, ilegal, imoral e engorda? Aos olhos da Lei como é descrita atualmente em vários países, sim. Não importa o argumento que você ou os advogados do Pirate Bay utilizam em sua defesa como eles não hospedarem as mídias digitais, mas apenas os links com indicadores de onde elas se encontram, pois o resultado é o mesmo: o internauta está baixando música (ou filmes, ou séries, ou programas, etc.) sem pagar aquilo que seus detentores têm o direito de cobrar. Isso que você baixa é um produto e, se você leva um produto e não paga, você está roubando.
“Opa, agora você pegou pesado”, deve estar pensando. “está me chamando de ladrão?” Eu não: as gravadoras. Calcadas nas regras oficiais que o poder jurídico ainda segue, não-atualizadas e que ainda defendem o “método tradicional de comercializar música”, elas atacam usando o medo: a lei está do nosso lado, você é o ladrão e criminoso por não pagar aquilo que nós oferecemos e merece ir para a cadeia por nos roubar. Está aqui na Lei. Nós estamos certos e temos todo o direito de te acusar. A causa é ganha ao nosso favor, porque a Lei é clara: você está me roubando e nós, gravadoras, estamos sendo lesadas.
Gerações mais antigas acatariam estas ameaças sem pensar. Desinstalar os programas não bastaria: eles trocariam o HD e queimariam o disco atual em praça pública, com o software instalado, em uma demonstração pública de pânico das gravadoras e de andar fora da linha. A geração internauta, no entanto, não pensa assim: ela simplesmente continua mexendo o mouse com a mão direita enquanto levanta o dedo médio da mão esquerda por trás dos monitores. Quando um povo, uma comunidade, um grupo de pessoas de qualquer tipo levanta a voz contra as regras vigentes e essa voz ganha cada vez mais ecos que se juntam a elas, ocorre um fenômeno que resulta na revisão das regras vigentes, que se adaptam à nova realidade incontestável que toda essa comunidade vive, quer ela queira, quer não. A este fenômeno, damos o nome de revolução.
Estamos todos empolgados ao ver este cabo de guerra: ficamos empolgados ao ver uma vitória dos compartilhadores e enfurecidos quando as gravadoras ganham um round, mas a verdade é que, ao contrário do que todos pensam, esta revolução ainda não começou: ela ainda está fervendo, se formando, ganhando uma força descomunal, tal qual uma garrafa de Coca-Cola que vem sendo agitada, desde 1999, por uma máquina industrial superveloz de misturar substâncias.
Quando alguém abrir essa tampa, de que lado você vai estar?